10 de maio de 2011

Direto de Cuiabá

Duas postagens que fizemos abaixo (uma sobre Peninha outra sobre Eladia Blasquez) mereceram comentários do leitor e amigo Manoel Lacerda Lima, direto do Mato Grosso.

Acerca da postagem Completamente Seu, diz Manoel:

a) Na vida, como em tudo que está no Universo, os processos obedecem ao gráfico cartesiano de início, crescimento, ápice e decrescimento, até chegar ao ponto big-bang, onde a energia se concentra e explode para dar início a algo novo.


b) Nenhum fato é bom ou ruim. O que é bom ou ruim é a atitude que se tem diante do fato. Assim, sentir revolta e conformismo diante de um fato, é apenas uma questão de escolha. O conformismo é uma virtude, porque é atitude própria dos fortes (virtude se inicia com vir, de viril), dos que têm a consciência de que tudo pode ser rerpcessado.

c) O poeta dá a lição dos que vê apenas o lado bom da vida:

- Ter saudade é melhor do que ter um mundo vazio
- A esperança faz parte natural da minha vida
- Você me ensinou muitas coisas, entre elas, a de não deixar morrer o sonho de sempre ser feliz.

Acerca da postagem Honrar  a Vida, diz Manoel:

Honrar a vida é viver intensamente o agora, dando verdadeiro significado ao existir, cujo alcance semântico vai além do significado de viver. Honrar a vida é estar consciente de que todo o universo circundante é produto da própria atitude mental. Saber que a queda (caída) pode fazer parte para aquele que não consegue transcender a lei de causa e efeito, tendo que cumpri-la, mas sabendo que cair é apenas uma etapa do levantar-se. A lei, toda lei, não existe para ser cumprida, mas sim, para ser transcendida. Só cumpre a lei aquele que provoca a materialização de sua incidência, que é sempre abstrata. Assim, quanto mais se transcende a lei de causa e efeito (lei do carma), mais se honra a vida. É um erro pensar que o sofrimento é necessário para a lapidação do caráter, pois ele é um processo de quem escolhe o caminho da dor, por não ter transcendido a lei de causa e efeito, obrigando-se à colheita do que plantou. Vejo na letra da canção de Eladia Blasquez uma mensagem oposto a de Francisco Octaviano, que expressou:


Quem passou a vida em brancas nuvens
E em plácido repouso adormeceu,
Quem não sentiu o frio da desgraça,
Quem passou pela vida e não sofreu
Foi espectro de homem, não foi homem,
Só passou pela vida, não viveu.

5 de maio de 2011

A Boca Escancarada de Devana Babu

Raul Seixas é um dos poucos compositores que eu conheço que fala, em suas músicas, sobre sua vida como artista, depois do sucesso e do reconhecimento. Isso é raro. É algo que só se vê em verdadeiras deidades musicas, categoria da qual faz parte.

Essas tais deidades são artistas de uma magnitude incomensurável na música, cujo poder e influência se estendem até os mais inesperados recantos. Geralmente, são artistas cuja discografia é gigantesca, e que não se podem envelopar em determinado período da história, embora tenham importância vital para vários deles. Caras que criaram a música, praticamente. Caras que são tocados de botecos ordinários a festas do Lago Sul.

Raul Rock Seixas pertence a essa categoria. A mesma em que estão David Bowie, Caetano Veloso, Bob Dylan, Elvis Presley, Arto Lindsay e os Beatles. É um grupo muito seleto. A maior parte desses caras, parece, não morrem nunca, e, não morrendo, não param de gravar e revolucionar nunca.

Raulzito, coitado, não aguentou tanto tempo. Mas pra quê mais?

Ouro de Tolo é uma canção que mostra bem esse lado dele, se bem que não seja dificil garimpar esse tipo de exemplo na sua obra. Muito pelo contrário.

Nessa canção, Raul fala sobre sua própria situação em determinada época da vida: batalhou, passou fome, lutou pela sua arte e se tornou um artista do mainstream, reconhecido, vendendo discos de platina, arrotando saúde, com casa, carro, e todas esssas porcarias. Mas Raul nos antecipa: e daí? Ele não acha graça nenhuma. Ele gosta é da luta, da dor. Conseguir não tem graça.

Belo dia, tendo voltado de manhã pra casa e acordando por volta do meio dia, desperto com minha imão falando: "Tí Claudinho mandou você fazer uma crítica sobre a música Ouro de Tolo". Ouvir isso ao despertar é, no mínimo, atordoante. Confesso, abestalhado, que não entendi nada, e o recém despertar não ajudou nem um pouco. Quê? Cuma? Por quê essa música? Tudo bem... gosto muito de Raul, tenho sua discografia completa em mp3, adoro essa música, mas... Por quê ela? Achei que titio estava doido. Tão jovem! Mas agora percebo quão maquiavélico ele foi. Não sei como, mas adivinhou minha alma, tocou na minha ferida. Agora percebo seu propósito e, portanto, aqui vão minhas impressões sobre a letra.

Não farei aqui uma análise da mesma. Cá ente nós, que me perdoem todos os analistas, mas esse lance de análise de música é besteira. E em todas as artes é assim. Ora, pra quê dizer o que o cara quis dizer com uma letra? O cara já não disse tudo... na letra! Daidecorrem duas coisas: se é preciso explicar a letra, ou o autor é muito ruim - e não foi bem sucedido em transmitr a mensagem - , ou o ouvinte é muito burro a ponto de não entendê-la. Ponto. Portanto, se você ler uma análise de música, fique atento: o autor da análise está te chamando, taxativamente, de burro.

Mas não se ofenda. Não há nada de errado em ser burro. Eu também sou burro e leio análises de músicas, porque existem pessoas muito mais inteligentes que eu, que entenderam coisas que eu jamais entenderia sozinho, e obrigado por me explicar.

Ainda: música é como piada. Não pode explicar, senão perde a graça, não é não?

Agora, falar sobre as impressões, histórias, desdobramentos, sentimentos... isso é outra coisa.

Ouro de Tolo.

Tio Maquiavélico.

Existe um momento, na vida de toda pessoa que tem alguma ambição artística, em que ela tem que dar uma resposta qualquer à sociedade e às pessoas que a cercam, ou com as quaias tem algum vínculo, inclusive afetivo e econômico.

Raulzito, meu filho, teve que ser um maldito, um artista vagabundo e imprestável, e teve que ser tornar o dito cidadão respeitável que ganha quatro mil por mês para, depois, fazer o que bem quisesse. Conquistar um milhão de coisas.

Ele desdenha de tudo isso. Ele não quer um corcel 73, nem dar pipoca aos macacos, nem andar de tobogã. Eles está dizendo claramente: gente, deixa de ser besta! Isso nao tem graça nenhuma, tem coisa muito melhor nessa vida. E está dizendo: vocês não podem me criticar, eu sou tudo o que voces são e tudo o que vcs queriam ser. E, ao mesmo tempo, está dizendo: deixem de ser bestas, seus artistinhas de merda. Façam como eu! Isso é uma etapa necessária.

Só raul pra pagar sapo pra todo mundo e sentar no trono de seu apartamento, altivo, mas sem se acomodar: com o olho fixo nos discos voadores. O que me lembra de meu tio Cláudio (pelo visto, maquiavel não encarnou só em papai).

Tio claudinho sempre foi meio ricardístico; A imagem do cara bem sucedido e corporativo, mas a inda assim um artista de qualidade inquestionavel e vivência imbarrável. É tudo o que gente como eu e Sakuro queríamos ser, mas não temos competência pra isso.

Ricardo, tio Cláudio, temos inveja de vocês.

Tio Claudinho me lembra muito a música ouro de tolo. Mas não levianamente. De forma assustadora! Um cara sentado no trono de um apartamente, em uma cobertura na área nobre de salvador, olhando para os discos voadores lá fora, disparando sua lira para todos os pobres mortais cá de baixo.

Ainda tenho flashs de mim e minha irmão Priscilla, comendo com ele no mac donalds, ou no cinema do pátio, ouvindo ele dizer sarcásticamente:

- Titio é o quê, meninos?

ao que respondíamos, eufóricos, em uníssono:

- Burguês!

Nem sabíamos o que queria dizer "burguês". Ele nos botava pra repetir isso. Eu achava que burguês queria dizer bicha, e ficava meio constrangido de chamar titio disso, mas pensava: se ele é que está pedindo, se ele gosta, tudo bem!

E aqui estamos Sakuro e eu, agora, a distribuir currículos em branco.

Senhores, está na hora de escancarar a boca cheia de dentes e esperar a morte chegar.

d.b iv/v/mmxi xv:xix - ouro de tolo


Nota do Editor:

Abaixo estão dois vídeos preparados para acompanhar a postagem, cujo conteúdo será replicado oportunamento. Quem fala o que quer...

Quem fala abaixo é Luiz Dantas, servidor da Auditoria Interna do INSS em Salvador, colega de trabalho, portanto, do Editor do CFL.



Quem fala abaixo é o Editor do CFL.

3 de maio de 2011

Caê no Caetano

Por Anne K.

Faz um tempo que procuro a intensidade que encontrei no Veloso. Ora tão baianamente calmo, dizendo suas palavras com uma voz tranqüila e doce, ora entrando nos meus ouvidos como quem entra numa casa sem dono e sem medo.

Há pouco eu ainda dizia que não gostava por não conhecer, então fui apresentada ao Cê, disco dele de 2006, que me proporcionou uma degustação de tudo o que Caetano significa, não só como o cantor que revolucionou o cenário musical brasileiro, mas me deu a impressão de conhecê-lo intimamente, como aqueles amigos que se conhecem em bares.

O disco é uma mescla de guitarras distorcidas, com palhetas marcadas, bateria acelerada e um baixo insano, lembrando toda a violência e vivacidade do rock'n'roll, com a voz calma e tranquila de Caetano. Letras fortes, diretas, sexuais, íntimas... Lembram uma conversa informal, um jogo de relações ainda não muito bem estabelecidas.

Os arranjos musicais são uma atração à parte. Cada acorde, cada nota, parecem ter sido propositalmente pensados para mergulhar o ouvinte em um extase hipnótico. As sensações das músicas, que ora tão sutis e ora tão extravagantes, não são inseridas no ouvinte, mas ao contrário, insere-o nela. Você se percebe dentro das músicas, em meio às notas doces, letras pesadas e vice-versa.

A intensidade do álbum é notável! Para os que já conhecem e admiram Caetano, o disco tão cheio de complementos e experimentos traz um novo frescor, um novo sabor. É um revival musical. Para os leigos, é um banquete de pequenas porções do que Caetano Veloso, enquanto músico, e um almoço de grandes pratos do que Caetano Veloso, enquanto ser humano.

O álbum se inicia com a música Outro, que por sua vez se inicia com a palheta marcada, guitarra levemente distorcida, bateria nervosa e um baixo que me lembra alguns rocks dos anos 50. A música ainda tem um apelo teatral e um solo de lembrar os ruídos tranqüilos de Jimmy Page. A letra é uma atração à parte e em uma palavra eu resumiria em esplêndida! Vemos essa irreverência e agressividade simpática em outras músicas como Rocks, Musa hibrida, Odeio, Homem, O herói... E esta última é de fato uma poesia com acompanhamento. Creio que é uma das críticas mais amargas e bem elaboradas que já pude ouvir.

Logo depois, temos um choque com uma música de levada tranqüila, com um baixo que de tão rápido, lembra o som de um clássico violoncelo. Uma música blue, Minhas Lágrimas. É como quando bebemos café quente e logo depois um copo de água gelada. A voz de Caetano agora tem maior destaque nessa música. A impressão que tive é que a melodia é apenas um acompanhamento, para uma poesia recitada, novamente. Então seguem músicas mais intimistas e calmas, que ganham uma leve distorção, trazendo a cara do blues à memória. Assim como ela, Não me arrependo, Um sonho levam as mesmas características.

Dentre as músicas está Waly Salomão que não tem muitas distorções, é uma música que é marcada intensamente pelo bumbo da bateria. Algo que lembre Mercedes Benz. Letra crítica e direta. E outra que é muito interessante é a Porquê?, que é uma repetição de duas ou três linhas de letras que falam muito mais que um discurso político.

E do disco, posso destacar como melhor música para mim, Deusa Urbana. Essa estímulou uma das coisas mais lindas da vida de uma pessoa: Ser tratada pela música. Sabe, caros leitores, creio que a música é a única coisa de fato sobrenatural. O poder que ela exerce sobre as pessoas não tem explicação. Não há como descrever com exatidão a sensação que a música pode nos dar. Deusa Urbana é a música do álbum que mais me falou ao pé do ouvido. Uma música que fala com você olhando nos olhos, sem máscaras ou sarcasmo.

O disco é intenso, denso, forte, gritante! Música que bate na sua cara e grita: Seja homem! Música que te chama para um café num fim de festa. Música que te veste e aquece. Música que tira sua roupa e te chupa com notas sutis. Música te ferve. Música que te esfria. Sem dúvida, esse disco foi um dos melhores presentes que pude me dar e um dos melhores remédios já receitados pra mim. Degustem...

2 de maio de 2011

Vá você!!

Para Maurício, que sabe as razões...

Há um poema do João Cabral de Melo Neto (perdoe falar do sagrado em meio a profanos) em que ele diz algo, mas não diz; implicita explicitamente. Vejam:

Tecendo a Manhã

1.
Um galo sozinho não tece uma manhã:
ele precisará sempre de outros galos.

De um que apanhe esse grito que ele
e o lance a outro; de um outro galo
que apanhe o grito de um galo antes
e o lance a outro; e de outros galos
que com muitos outros galos se cruzem
os fios de sol de seus gritos de galo,
para que a manhã, desde uma teia tênue,
se vá tecendo, entre todos os galos.


2.
E se encorpando em tela, entre todos,
se erguendo tenda, onde entrem todos,
se entretendendo para todos, no toldo
(a manhã) que plana livre de armação.

A manhã, toldo de um tecido tão aéreo
que, tecido, se eleva por si: luz balão.

João Cabral de Melo Neto

Na produção abaixo (vide agora o que quero dizer com profanar), há algo que lembra isso nesse singelo "vá você"

Familiar, Maurício?!.



vá você

não há o que fazer
você se recusou a me dar atenção
e eu não vou esquecer
quando eu disse que sim você falou que não
eu tentei entender
eu quis lhe explicar mas você se opôs
o que eu posso fazer
cê só pensa em você não pensa em nós dois

vá você
num bota minha mãe
no meio disso ela não tem nada a ver
num xinga minha irmã
ela não faz fofoca ela não é você
corno é o seu pai
pergunta pra sua mãe que você vai saber
viado é seu irmão
não desgruda de joão cê pensa que eu não sei

vá você
pode me ameaçar
pode descabelar eu tô é por aqui
num fala assim de pai
que pai morreu dizendo pra eu largar de ti
cê aprontou demais
eu nunca tive paz derna que eu te achei
naquele pardieiro
chei de gigolô lésbica puta e gay

De: Paulinho Dagomé
Por: Isaac Mendes

Muito Tempo Depois

... é que Fábio e Maurício só nasceram muito tempo depois.

Fábio, Maurício, Eu, Petrônio e Paulinho II

Eu, Fábio, Maurício, Petrônio e Paulinho