28 de fevereiro de 2007

Conto de Fadas - Parte I

Ali pelos 17, eu estudava em Santa Maria da Vitória e morava numa república. Por aquela época, eu trabalhava no Banco do Brasil e não estava gostando de morar com aquele pessoal. Muita neurose junta. Foi quando uma amiga, irmã de uma colega de sala, disse-me que seu irmão, Lulu, havia se separado e estava morando sozinho. Lulu era arquiteto e topógrafo. Sua casa, ele mesmo a projetara. Descrevo-a. A casa ficava a 20 metros do Rio Corrente. Bastava sair do jardim e descer para o rio. Por esse tempo, eu não sabia nadar, o que tornava inútil tal proximidade. Lulu desenhara a casa de modo que ficasse recuada. A parte da frente virou jardim. Havia uma sala, dois quartos relativamente grandes, um pequeno quintal, o escritório do meu amigo, e uma cozinha em dois ambientes. A casa era toda branca. As janelas, elas se abriam em duas bandas e tinham contornos arredondados na parte superior. As laterais da casa também eram ajardinadas. O telhado era em duas águas (se é que o termo técnico é esse). Quando fui apresentado a Lulu, sujeito muito tímido mas muito agradável. A empatia foi imediata. Coincidentemente, a mim também me chamavam de Lulu, na escola. E, no trabalho, de Lula. Pois bem. Lulu, depois que da separação, entrou numa espécie de melancolia. Enclausurou-se. E, coisa inusitada, começou a beber. Sua ex-mulher, que depois conheci, vez por outra ia lá, conversava comigo, estragava o dia dele e partia. Mas isso é outro capítulo. O certo é que Lulu me disse: “Lula, você vai ocupar o quarto que fica para o jardim. Não repare. Esse quarto, quando o desenhei, era para minha filha. Os papéis de parede e todas essas frescuras você mantém se achar conveniente. Seus livros, se quiser, pode colocar no escritório. Eu quase não uso.” Na época, estava viciado nos escritores portugueses e lia a obra do Antero de Quental. “Coração Liberto” e outras mumunhas mais. Peguei minha mala, abri o guarda-roupa embutido, instalei lá meus anexos, e fui ler no jardim, ouvindo o silencioso e inaudível correr das águas do Rio Corrente. Naquela noite primeira, fui dormir com uma sensação estranha, mas ao mesmo tempo agradavelmente confortável. Ao amanhecer, ao abrir as janelas, a luz do sol penetrou pelo quarto. Era muito cedo, e gotas de orvalho ainda brilhavam nas rosas e nas gramas do jardim. Imediatamente pensei em Minéia. Tenho minhas razões para isso. O sol, naquela manhã, me dava boas-vindas. Pareceu-me estar nascendo novamente. Pareceu-me que a vida que eu levava tinha sido definitivamente colocada num baú. Pareceu-me que a paz que eu nunca tive, se apoderara de mim, e tinha o sol como seu mensageiro, luminoso mensageiro. Levantei-me e....

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