23 de fevereiro de 2009

Eu não lhe prometi um mar de rosas

Ele me disse que graduar-se em filosofia sempre foi um sonho, dado que, desde criança, gostava de espantar-se. Tudo para ele era motivo de “Oh!”. Até mesmo na adolescência, quando a gente já não se espanta com tanta facilidade, ele sempre se assombrava com as coisas mais banais, tipo: a irrepetibilidade dos arrebóis, a influência das fases lunares no ofício de cabeleireiro, a “influência má dos signos do zodíaco”, etc. De modo que, pra ele, cursar filosofia significaria dedicar-se – integralmente – ao exercício do mais puro espantamento, que as aulas todas seriam overdoses de pasmos, espasmos, espantos, estupefações, assombros, admirações, frissons, estarrecimentos e pavores e temores e tremores. Qual nada! O que o deixa espantado mesmo é o elenco de livros indicados nas ementas. Não bastasse a bibliografia básica, vem ainda a complementar (que tende a ser maior que a outra). E tem a bendita lógica! E tem ainda os infinitos fragmentos a serem interpretados! E tem a irritante dúvida metódica! E tem a ilegibilidade do prefácio da Fenomenologia do Espírito! E as teogonias! E as cosmogonias! Pra ele (não vou declinar o nome porque este jornal prima pelo respeito às suas fontes), bastava que a grade curricular constasse de Metafísica e Filosofia da Linguagem. Pronto. A receita dele é simples: a gente mete as caras no Ser e o descreve. Simples. Ele crê que todas as disciplinas, exceto aquelas duas, estão trafegando nos arredores, nas cercanias, nas beiradas, na periferia do Ser. Indo direto ao ponto, ganha-se tempo e chega-se logo à Verdade (sim: moral, lógica e ontológica). Do contrário, é-se um Ser s(e)m Tempo. Ele (não vou declinar o nome!) esperava mais do curso de filosofia. E teme virar um cético dogmático. Teme perder o pendor, a vocação para espanto.

2 comentários:

d.b disse...

acho que o curso de filosofia está matando alguém...

Saulo Madrigal disse...

O ser é a matéria universal, a partícula aglomerada da necessitude de existir-se ser humano. O espanto...Ah! esse sentimento de estar vivo em contraposição ao não ser, a ant-matéria que faz a matéria existir-se ser humano. A ant-partícula não aglomerada da necessitude de metaforozar-se.
Tenho dito!